quarta-feira, 24 de junho de 2009

A tênue diferença entre os academicamente graduados e os colaboradores da Imprensa Brasileira


Sempre gostei de comentar, ou melhor, dar os meus pitacos sobre assuntos que de alguma forma me incomodam. Como não poderia deixar de ser, a decisão do Supremo Tribunal Federal em não averbar a obrigatoriedade do diploma de ensino superior para o exercício da profissão de jornalista, julgada improcedente na assembleia do último dia 17 de junho, é uma delas. Vou tentar manter a imparcialidade e, desde já, peço perdão se de alguma forma não atender aos anseios dos meus leitores. Não buscarei o corporativismo profissional e nem tão pouco aceitarei os argumentos medíocres do qual execraram a minha profissão. Basearei a minha argumentação sobre o que tenho percebido com os avanços midiáticos do século XXI, como a digitalização da informação e a emancipação intelectual através dos portais da rede mundial de computadores.

Considerado inconstitucional pela maioria dos Ministros do STF, foi indeferido o decreto-lei nº. 972 de 1969, que estabelece que o diploma de Bacharel em Jornalismo seja necessário para o exercício da referida profissão. Segundo os magistrados, a resolução é antiquada e não atende aos critérios da Constituição de 1988 para a regulamentação de profissões.

O Ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal - e relator do pedido -, abriu a sessão defendendo a extinção da obrigatoriedade do diploma acadêmico alegando que ela impede a liberdade de expressão dos cidadãos de se manifestarem nos meios de Imprensa e de comunicação em massa. O voto do relator foi acompanhado pelo consenso dos Ministros Eros Grau, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Cezar Peluso, Carmen Lucia e Ellen Gracie. O Ministro Marco Aurélio foi o único contrário ao requerimento em pauta. Já os Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Alberto Menezes não estiveram presentes na histórica sessão.

O processo teve início em outubro de 2001, quando o Ministério Público Federal, a pedido da FENAJ, entrou com uma ação judicial na qual se mantivesse a obrigatoriedade do diploma de Jornalista para o exercício da profissão nas empresas de notícias. Uma liminar editada ainda no mesmo ano suspendeu a exigência do diploma acadêmico aos não graduados. Com o novo impasse, a FENAJ (Federação Nacional dos Jornalistas) entrou com um novo recurso na Justiça Federal.

Em outubro de 2005, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que a diplomação é realmente necessária para o bom exercício profissional e deu causa de ganho à Federação. Como já existem profissionais muito qualificados atuando há vários anos nas redações e oriundos de um período em que a exigência não era obrigatória, foram impetrados um novo recurso do Ministério Público Federal junto ao STF e, em seguida, uma ação para garantir o direito ao exercício da profissão aos não graduados academicamente até o recurso final outorgado pelo Supremo.

Em novembro de 2006, o STF decidiu liminarmente pela garantia do exercício da atividade jornalística aos que já atuavam na profissão independentemente de registro no Ministério do Trabalho ou de diploma de curso superior na área.

No dia 17 de junho de 2009, o Superior Tribunal Federal excluiu definitivamente a exigência do titulo acadêmico, pondo um ponto final no imbróglio que se arrastava há anos.

Desejo ressaltar que a questão em si deve-se ao poder político dos grandes conglomerados jornalísticos, visto que o Recurso Extraordinário nº. 511.961 foi interposto pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo e pelo Ministério Público Federal. Obviamente, uma decisão corporativa e particular e não uma ação coletiva emanada pelo desejo da população civil.

O que não foi abertamente esclarecido para os futuros acadêmicos, segundo a diretora do Sindicato dos Jornalistas de Juiz de Fora, jornalista Lúcia Schmidt, foi o significado da abolição do inciso V do artigo 4º do decreto-lei nº. 972 de 1969, julgado improcedente por fixar exclusividade apenas a uma categoria profissional para se manifestar em um meio de comunicação. Conforme o seu artigo assinado no jornal O Tempo, no dia 21 de junho de 2009, permanecem inalterados os demais dispositivos da regulamentação da profissão de jornalista junto à Imprensa Brasileira, não havendo prejuízo aos novos profissionais.

Em minha opinião, tal inciso estava realmente em desalinho com o atual cenário midiático proporcionado pelas inovações do século XXI, mas acho a medida precipitada quanto a sua imediata aplicação.

Justifico: durante o período ditatorial imposto ao país durante os Anos de Chumbo, os jornalistas eram vistos como ativistas que insurgiam as massas populares contra o regime dos generais. A intenção governamental era diminuir as críticas contra a ditadura elevando o nível de controle intelectual dos futuros formadores de opiniões e nos meios de comunicação, através de pequenos grupos de profissionais moldados e monitorados em escolas das quais seriam supervisionadas pelo Governo. Acontece que uma universidade é um centro de saber e as insurgências aconteceriam, como aconteceram em 1968 motivando a instauração do Ato Institucional nº. 05.

Essa classe pensante e questionadora de seus direitos não pode simplesmente ser apagada de uma hora para outra como um papel velho que se joga na lixeira. Não havia a necessidade de o Supremo Tribunal Federal promulgar de forma definitiva uma decisão drástica e polêmica sem ao menos um prazo de carência para que fossem estabelecidas novas diretrizes profissionais sem um prejuízo à classe dos jornalistas. Restou a simbologia escrita do termo “jornalista” como sendo necessária para o devido registro profissional junto ao Ministério do Trabalho e Emprego, possuindo o titulo acadêmico ou não.

Para as empresas, ficou a já existente obrigatoriedade proporcionada à maioria das profissões no momento de contratar funcionários. No nosso caso, para a atividade de jornalista em tempo integral: garantir-nos o título com o respectivo registro de nossa função no Ministério do Trabalho.

Claro que a desobrigatoriedade do diploma aprovada pelo STF aumenta a concorrência predatória dentro das agências de Imprensa e a provável desvalorização tanto profissional quanto salarial de todos os jornalistas. E olha que o salário já é pouco! Mas um profissional bem qualificado vale o seu peso em ouro.

Por isso, afirmo que é equivocado dizer que uma empresa de comunicação, com um ótimo know-how de prestígio junto aos seus leitores, abrirá mão de ter um profissional gabaritado para representá-la perante o seu público. Como sabemos, em quase todas as grandes empresas - para a obtenção de um vínculo empregatício - é necessário uma prévia seleção dos candidatos, onde aqueles possuidores da diplomação superior estarão mais qualificados do que outros que não possuem tal referência. A revogação apenas preserva a condição profissional daqueles que já atuam há vários anos como jornalistas, tendo a experiência prática como aval para a sua permanência dentro do meio informativo empresarial.

O que me incomodou foram as formas de expressões utilizadas pelos Ministros do Supremo demonstrando uma total incapacidade de percepção e acuidade sobre a profissão jornalística ao defenderem os seus pontos de vista sobre o assunto. Creio que, no mínimo, foram deselegantes e extremamente soberbos quanto ao desconhecimento do valor cultural, social e imprescindível do profissional de Imprensa. Soou como se fossemos uma casta social que não representa em nada os interesses da população junto às esferas do poder nacional. O simbólico título de O Quarto Poder, aquele que fiscaliza as ações políticas e sociais do país, é um empecilho às falcatruas e leviandades cometidas contra o povo brasileiro, fato do qual a Imprensa nunca foi omissa ou ignorou a sua real função de combater a injustiça e a desigualdade no que tange à informação aos seus leitores.

A sociedade contemporânea necessita do jornalista - do verdadeiro jornalista - indiferente de diploma ou não! Vivemos em um mundo globalizado, virtualizado e carente de pessoas que interpretem e compreendam o cenário midiático atual, com seus logins, plugins, e linguagens específicas da nova convergência de suportes oferecidos pela interação textual, áudica e visual comportadas em aparelhos cada vez mais sofisticados e de uso popular.

Começarei pela argumentação do Ministro Gilmar Mendes. O digníssimo presidente do STF, também relator do processo, destacou que a exigência do diploma não garante qualidade aos profissionais. Segundo ele, "a formação específica em cursos de jornalismo não é meio idôneo para evitar eventuais riscos à coletividade ou danos a terceiros".

Afirmou, ainda, que o diploma para a profissão de jornalista não garante que não haverá danos irreparáveis ou prejudiciais aos direitos alheios.

"Quando uma noticia não é verídica ela não será evitada pela exigência de que os jornalistas frequentem um curso de formação. É diferente de um motorista que coloca em risco a coletividade. A profissão de jornalista não oferece perigo de dano à coletividade tais como a medicina, a engenharia e a advocacia nesse sentido; por não implicar tais riscos não poderia exigir um diploma para exercer a profissão. Não há razão para se acreditar que a exigência do diploma seja a forma mais adequada para evitar o exercício abusivo da profissão", argumentou em seu discurso de abertura.

Durante a sua oratória, Mendes foi ainda mais equivocado quanto ao seu conhecimento sobre a profissão da qual julgava, quando comparou, equivocadamente, os afazeres jornalísticos aos de um cozinheiro. "Um excelente chefe de cozinha poderá ser formado numa faculdade de culinária, o que não legitima estarmos a exigir que toda e qualquer refeição seja feita por profissional registrado mediante diploma de curso superior nessa área. O Poder Público não pode restringir, dessa forma, a liberdade profissional no âmbito da culinária. Disso ninguém tem dúvida, o que não afasta a possibilidade do exercício abusivo e antiético dessa profissão, com riscos eventualmente até à saúde e à vida dos consumidores", concluiu.

Sobre as faculdades, o Ministro Mendes não acredita em um descrédito quanto à importância da graduação superior ou quanto ao fechamento dos cursos de jornalismo. Segundo ele, "tais cursos são importantes e exigem preparo técnico e ético dos profissionais para atuarem. Os jornalistas se dedicam ao exercício pleno da liberdade de expressão. O jornalismo e a liberdade de expressão, portanto, são atividades imbricadas por sua própria natureza e não podem ser pensadas e tratadas de forma separada", enfatizou.

Desejo respondê-lo:

Quanto “à formação específica em cursos de jornalismo não é meio idôneo para evitar eventuais riscos à coletividade ou danos a terceiros”, concordo aparentemente com o ilustre magistrado e peço que relembremos casos em que profissionais mal qualificados, ou até mesmo mal intencionados, causaram prejuízos físicos e morais à sociedade e a cidadãos que tiveram a vida totalmente execrada pela mídia em um âmbito público generalizado.

O caso ESCOLA BASE reflete um triste passado onde cidadãos brasileiros foram presos, coagidos, torturados e depois inocentados pela inveracidade das informações divulgadas por jornalistas que não tiveram o bom senso de ouvir as partes envolvidas, dando razão a um delegado que somente queria aparecer nos holofotes que a Imprensa oferecia, e a ambos especuladores de interesses recônditos de intuito a se promoverem quanto profissionais de ponta.

Concordo em parte que, não foi preciso um diploma para causar tamanho dano público. Os fatos provam que houve uma parcialidade e cumplicidade destes maus jornalistas - especulo que nunca foram os melhores em suas turmas de aula.

Imagino nos tempos de graduação: “Fulano, tô ferrado! Dá para colocar o meu nome no seu trabalho?” Esperar o quê de um cara desses? Mesmo tendo sido graduados, são medíocres. Não assimilaram nenhum conhecimento teórico, humanístico, técnico e ético sobre o valor de ser um jornalista. Mas, todos eram graduados? Se forem, concordo com o Ministro. Pelo menos especulo que o delegado não tinha, ou tem, formação superior em Jornalismo.

É fato que as ações da Imprensa e da Polícia Civil de São Paulo à época, foram negligentes e co-autoras de um dos episódios que se tornaram exemplos a serem estudados nos cursos de Jornalismo. Se este fato é debatido em salas de aula logo no primeiro período de graduação, quem os desconhecer estará pré-apto a repeti-los. Daí a importância do conhecimento educacional para que o jovem jornalista se lembre de um erro que nos envergonha e muito, pois faltaram a ética e o bom senso que somente os bem treinados profissionais conseguiriam ater-se pelo discernimento na formulação das informações a nós prestadas.

Sebastião Nery, jornalista, filósofo e bacharel em Direito, escreveu em seu livro Os Grandes Pecados da Imprensa, um capitulo sobre Paulo Francis (jornalista não graduado) em que o finado correspondente põe em dúvida a idoneidade de nada mais, nada menos que Ruy Barbosa, em um artigo publicado no dia 03 de março de 1991, no jornal O Estado de São Paulo. Segundo o pseudo-jornalista, “Ruy Barbosa levava para sua casa em Botafogo cadeiras com a insígnia RB, que queria dizer República Brasileira, e ele rebatizou de RB, Ruy Barbosa”.

Um ano depois, em 17 de junho de 1992 no mesmo O Estado de São Paulo, Paulo Francis voltou a atacar o poeta Ruy Barbosa: “Ruy levou 5 mil contos de réis a D. Pedro II, quando deposto, embarcando para a Europa. Pagou? Ou furtou? Quando eu era garoto, morei perto da casa de Ruy, em Botafogo, e as cadeiras tinham escrito RB, Ruy Barbosa, mas diziam que ele as tinha roubado e o RB queria dizer República Brasileira”.

Segundo Sebastião Nery, nunca houve “República Brasileira”. Foi o próprio Francis quem inventou o termo. Desde 1889, com a proclamação de Deodoro da Fonseca, o termo sempre utilizado foi “República dos Estados Unidos do Brasil”. A Assembleia Constituinte de 1987 mudou-o para República Federativa do Brasil. Nunca, em livro histórico algum, ouviu-se falar na inacreditável estória de Paulo Francis. Apesar de toda a brutal oposição que Ruy Barbosa enfrentou em meio século de lutas políticas, no Império e na República, nenhum periódico qualquer mencionou tal fato. Foi mais uma leviandade inventada pelo Srº. Paulo Francis durante o seu exercício na profissão de jornalista.

Quanto aos 5 mil réis, o jornalista Francis não mentiu, mas fraudou e distorceu a informação publicada. Nery explica:

“O decreto nº. 2 do Governo Provisório, de 16 de novembro de 1889, logo no dia seguinte à proclamação da República, com Dom Pedro ainda no Rio de Janeiro, assinado por Deodoro e todos os membros do governo, ‘concedeu ao Srº. Dom Pedro de Alcântara a quantia de 5.000:000$ de ajuda de custo para o seu estabelecimento no estrangeiro’. Um general entregou ao imperador o decreto dos 5 mil contos e a mensagem do prazo de partida, e ele aceitou e agradeceu, em um bilhete a Deodoro, onde falou da ‘pátria de nós estremecida’. Mas quando os tenentes Jerônimo Teixeira França e Agostinho d’Almeida subiram a bordo do navio ‘Parnaíba’ e entregaram um envelope com o dinheiro, Dom Pedro recusou”. Ruy Barbosa nem lá estava e Paulo Francis também não. Isto não o impediu de especular e caluniar o antigo estadista brasileiro.

Além destes, muitos outros foram atingidos por campanhas difamatórias junto à Imprensa, como o ex-Ministro da Saúde Alceni Guerra, na gestão presidencial Collor de Melo, na década de 1990. Os jornalistas responsáveis? Senhores Alberico Souza Cruz e o ex-centenário Roberto Marinho.

Continuando a argumentação do Supremo Ministro, penso eu que: se um jornalista pode ser comparado a um cozinheiro - não menosprezando ou inferiorizando a profissão -, digo que o ilustríssimo relator deva optar em tornar-se um herbívoro, alimentando-se somente de hortaliças e feno, pois creio que se um Chef de cozinha errar em sua profissão o tempero, não medir devidamente a proporção dos seus condimentos, não cozinhar os legumes ou mesmo não lavar o seu material de trabalho, é extremamente provável que possa causar uma enorme má digestão ou uma perturbação estomacal generalizada ao oferecer aos seus clientes uma suculenta gororoba de letrinhas.

Quanto à continuidade do curso de Jornalismo nas instituições superiores, pelo menos eles - os Ministros do STF - viram a coerência na importância do saber. Menos mal!

O fim da obrigatoriedade do diploma para jornalista é apenas uma oficialização do que já acontece, na prática, nas grandes redações do país. O STF seguiu o entendimento proposto pela ANJ (Associação Nacional dos Jornais), que prefere, por exemplo, que um economista preste esclarecimentos técnicos sobre artigos que envolvam o Caderno de Economia.

Segundo o diretor do Comitê de Relações Governamentais da entidade, Paulo Tonet Camargo, “a ANJ não é contrária ao diploma e nem à formação do jornalista, mas avalia que a obrigatoriedade do mesmo fere a liberdade de expressão”. Em sua opinião, o diploma é importante mas não fundamental para o exercício do trabalho nas redações e nos meios de comunicação, visto que existem profissionais de outras áreas acadêmicas melhores qualificados para responderem a um determinado assunto.

Seguindo as argumentações corporativas, os outros Ministros do STF acompanharam o voto do seu presidente. Na avaliação do Ministro Gilmar Mendes, o inciso que estabelece que o diploma superior seja necessário para o exercício da profissão de jornalista não atende aos critérios da Constituição de 1988 para a regulamentação de profissões.

A argumentação da advogada do Sertesp, Drª. Taís Gasparian, ressalta que a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo é inconstitucional porque a Constituição de 1988 garante a liberdade de expressão e do livre pensamento. Gasparian afirma que a profissão de jornalista não depende de conhecimentos técnicos.

“A profissão não depende de um conhecimento técnico específico. A profissão de jornalista é desprovida de técnicas. É uma profissão intelectual ligada ao ramo do conhecimento humano, ligada ao domínio da linguagem, procedimentos vastos do campo do conhecimento humanista, como o compromisso com a informação e a curiosidade. A obtenção dessas medidas não ocorre nos bancos de uma faculdade de jornalismo.” A defensora disse, ainda, que em outros países como os Estados Unidos, a França, a Itália e a Alemanha não há a exigência de tal diplomação superior.

Como não precisa de técnicas? Ela acha que não temos os mesmos conceitos éticos, estruturais, analíticos, oratórios e todos os afins que a profissão de bacharel em Direito também possui? Salvo não me engano, o título que ela ostenta é a de Bacharel em Comunicação com habilitação em Direito. Bacharéis em Comunicação também somos. Observem a sua incoerência:

“É uma profissão intelectual ligada ao ramo do conhecimento humano, ligada ao domínio da linguagem, procedimentos vastos do campo do conhecimento humanista, como o compromisso com a informação e a curiosidade”.

Gasparian está falando de qual profissão? Da dela? Permitam-me utilizar do mesmo latim do qual os juristas do Direito se utilizam, ou melhor, dos intelectuais Bacharéis em Comunicação Social:

“Ad aeterno nascuntur poetae, fiunt oratores. Ab alto, ab imo pectore, acta est fabula ad nutum. A quo, aequam memento rebus in arduis servare mentem, aequo animo ars longa vita brevis, aliquando bonus dormitat Homerus”.

(Desde a eternidade os poetas nascem e os oradores se fazem. Sem conhecimento aprofundado e minucioso, do fundo do coração, acabou-se a história pela vontade de uma das partes em posição superior. Na ignorância, lembra-te de manter o ânimo justo nos momentos difíceis, com equilíbrio de julgamento, pois a arte é longa e a vida é breve e de vez em quando, o bom Homero cochila; todos erram, ainda os que são do valor de Homero).

Em contrapartida, o advogado da FENAJ, Drº. João Roberto Fontes, defendeu a obrigatoriedade do diploma acadêmico como essencial para a boa prática do jornalismo. "A exigência do diploma não impede ninguém de escrever em jornal. Não é exigido diploma para escrever em jornal, mas para exercer em período integral a profissão de jornalista. O jornalismo já foi chamado de Quarto Poder da República. Será que não é necessário o conhecimento específico para ter poder desta envergadura? Um artigo escrito por um inepto poderá ter um efeito devastador e transformar leitores em vítimas da má informação", enfatizou Fontes.

Pode até parecer um absurdo ou uma hipocrisia de minha parte, mas esta decisão do STF não me causou surpresa. A liberdade de se expressar na mídia, indiferente de sermos jornalistas ou não, ocorreu primeiramente no Rádio e na Televisão, e depois no Jornalismo Impresso. Com a implantação da tecnologia digital nas redações, a profissão de fotojornalista sofreu uma mudança brusca quanto a sua produção, aceitação contextual e queda do suposto elitismo dos fotógrafos de Imprensa. A tecnologia da telefonia digital proporcionada pelos novos aparelhos celulares, com a inserção de câmaras digitais em seu corpo, banalizou o estereótipo de que somente os repórteres fotográficos eram capazes de produzirem e assimilarem de forma jornalística o cotidiano das cidades. Tudo isso graças à liberação do uso civil da internet fora dos meios militares de defesa.

Acredito em um discurso positivista sobre os direitos de cada cidadão em ser uma fonte de informação argumentativa. A evolução digital proporcionou uma maior igualdade no direito a liberdade de expressão das pessoas. Digo que “as coisas não pertencem mais ao tempo. Pertencem a um outro tempo que é de todo mundo”.

Essa ideologia me faz argumentar que a veiculação de um material produzido por não jornalistas, respeitando os devidos conhecimentos técnico-acadêmicos em um ambiente restrito a formadores de opiniões, contribui para a disseminação das oportunidades informativas em respeito às manifestações sócio-culturais abrangidas pela representatividade do emissor quanto fonte de representação individual e humana. Essa liberdade em se expressar deve ser aceita como cultura de massa, ressaltando que o indivíduo vive e interage em um mundo cada vez mais globalizado e informativo, capaz de influenciar o comportamento geral de toda a aldeia global.

Por isso a importância da valorização do diploma acadêmico de jornalista e a aceitação de que não somos os únicos capazes de informar sobre um assunto que, muitas vezes, é complexo de ser explicado sem a presença de um especialista de uma devida área do conhecimento humano.

Ainda é cedo para que todo esse processo de aprimoramento social alcance um formato mais definível para uma análise mais estruturada. Devemos aguardar a conclusão das mudanças midiáticas propostas pela internet com a absorção de todos os suportes capazes de difundir uma mensagem. Acredito que a profissão de jornalista não corre nenhum risco de desaparecimento dentro desse novo conceito de Imprensa, onde as informações técnicas veiculadas sobre determinados assuntos no meio poderão ser produzidas por profissionais não jornalistas.

Pondero que, em uma observação social, tais articulistas não são jornalistas por vocação e ignoram detalhes que são primordiais para a complementação mais ideológica do texto escrito. Ressalto que a informação não é uma propriedade privada, por isso a sua constante emancipação dos meios jornalísticos.

Desejo pronunciar-me mais um pouco.

Apesar das críticas que receberei de colegas de profissão, sou defensor de um curso técnico em formato de pós-graduação para profissionais de outras áreas acadêmicas, devidamente graduados, que queiram participar do fantástico universo do jornalismo, especificando um determinado ramo de atuação. Caso desejem uma abrangência maior, que sejam obrigados a se graduarem normalmente como todos os outros jornalistas.

Só para polemizar, faço-lhes a seguinte pergunta:

Você, jornalista graduado ou em formação, acha mesmo ser necessário ter um diploma para justificar a porcaria de jornalismo marrom que assistimos na TV e lemos nessas revistas fúteis de fofocas? Um canudo não quer dizer nada. Conteúdo profissional sim!

Entrevistas satíricas e sem cunho informativo, repórteres com figurinos de palhaços trabalhando como paparazzis da vida alheia e apresentadores que não sabem regras básicas até mesmo de como se portar perante o vídeo são jornalistas? O que você acha? Por possuírem graduação superior são bons profissionais?

Respondo-lhes que isso pode ser chamado de cultura de massa, ou melhor, cultura de entretenimento. Um produto da Indústria Cultural. Sobre isto, explico.

Apocalípticos versus Integrados: de quem é a razão?

Uma das disciplinas que cursei na faculdade teve como tema de estudo o livro do jornalista italiano Umberto Eco intitulado Apocalípticos e Integrados, que trata sobre a questão da indústria cultural e a cultura de massa na década de 1960.

A argumentação ideológica de conceitos genéricos proposta por Eco era a formulação de uma nova orientação nos estudos relativos aos fenômenos da cultura de massa, criticando a postura apocalíptica dos teólogos da Escola de Frankfurt - que acreditavam que a cultura de massa era extremamente prejudicial aos valores artísticos e morais - contrapondo-a aos princípios de que a própria cultura de massa é resultado da integração democrática das massas populares na sociedade, defendida pelos teólogos Integrados.

Os Apocalípticos viam a cultura de massa como uma anticultura que se contrapunha à cultura em seu sentido aristocrático, sendo por eles considerada uma decadência quanto aos valores sociais da época.

Os Integrados viam nesse fenômeno a simples abertura cultural da própria sociedade com a circulação de novas correntes de uma arte e de uma cultura provinda dela mesma, como um processo natural de evolução social.

O termo “Indústria Cultural” foi cunhado pelos frankfurtianos Theodor Adorno e Max Horkheimer, na década de 1940. O discurso iniciado por eles demonstra como o uso indiscriminado e impensado da mídia pelas elites sociais pode comprometer a sociabilização do homem. Tal mecanismo induz a passividade crítica dos cidadãos que consomem, diariamente, uma carga informativa e ideológica do mundo que os cercam, impedindo-os à uma formação reflexiva sobre o conteúdo assimilado.

Quanto à formação do pequeno cidadão, digo, das crianças e dos adolescentes, segundo o sociólogo Émile Durkheim, em As Regras do Método Sociológico, “a educação é um dos principais agentes coercitivos, responsável por moldar as crianças à sociedade”. Durkheim também afirmava que a sociedade detém um caráter de exterioridade aos indivíduos. Estes, ao não se adequarem, sofrem sanções psicológicas.

Reconhecemos a influência da mídia sobre o indivíduo e o seu enorme poder de persuasão em seus receptores. Como instrumento educandário, espera-se que ela seja um veículo promotor da inclusão dos cidadãos e defensora de seus direitos quanto pessoas conscientes dos fatos que acontecem no mundo e em suas cidades que, direta ou indiretamente, possam vir a afetar o seu estado público de direito.

Sob o ponto de vista apocalíptico, a desobrigatoriedade do diploma de jornalista diminui a qualidade ética e técnica no manuseio informativo formador de opiniões, haja visto que são necessários vários conteúdos culturais para se exercer com dignidade o papel de representante intelectual da população.

Para muitos de nós, jornalistas, a atual medida judicial coloca em xeque nossas vaidades, competência e responsabilidades. Uns, porque os intermináveis anos de sacrifício durante a graduação não mais os diferenciam em um meio profissional que era somente deles. Perdeu-se o glamour, o brilho da exclusividade do “ser” jornalista, do intelectual que a tudo sabia.

Outros, agradecem a oportunidade de poderem se expressar em um produto que eles também consomem, e muitas vezes, se sentem ofendidos ao ouvirem, ou lerem, um artigo que não condiz com o real significado que ele detém quanto profissional próprio da área.

Conforme mencionei, somente o bom profissional, aquele atualizado com o atual contexto mundial e com as possibilidades de interação em todas as mídias informativas através dos novos e contínuos processos evolutivos da comunicação, sobreviverão a este novo cenário interposto a nós. (CS)